Mas o que é um projeto? Uma das definições mais famosas
é a do Project Management Institute (PMI):
Projeto
é um empenho assumido, temporário, para obter-se um resultado único [...].
Temporário significa que esse resultado tem um início e fim definidos. Único
significa que o resultado é diferente, sob alguns aspectos, de outros similares.
O roteiro de elaboração de um
projeto varia bastante de instituição para instituição, ou de acordo com os
objetivos do autor. É importante ter em mente que ele é um guia, não um
documento hermético ou mapa do tesouro. Deve ser compreensivo e direto. Isso
exige a realização de uma pesquisa prévia sobre o tema, além da organização dos
conceitos e da questão que será abordada. Existem inúmeros livros que detalham
passo-a-passo o processo de elaboração de um projeto. Utilizamos o Metodologia:
processo de produção, registro e relato do conhecimento, de Ofélia M. G. Charoux. DVS Editora,
2006.
Como prometido no último post, seguem partes do nosso projeto de
pesquisa com alguns comentários:
Título [retirado do
projeto]
A HISTÓRIA SÓCIOPOLÍTICA DO ACRE E DE SEUS HABITANTES
BASEADA NO MITO DA FIGURA DE CHICO MENDES: UMA ABORDAGEM MICROHISTÓRICA
REGIONAL E GLOBALIZADA, PERSPECTIVAS DE UM FUTURO SUSTENTÁVEL.
Comentário: O título não precisa ser, necessariamente, idêntico à
formulação do tema, mas sugeri-lo. Ele aponta sobre o que trata o trabalho. Deve ser breve e dar a entender qual tema
será abordado. Percebe-se que o nosso título ficou amplo e com tema difuso. É
muito difícil contar a história sócio-política do Acre e de seus habitantes em
um livro-reportagem. A primeira consideração do revisor foi modificá-lo e
delimitar o tema proposto.
Introdução [trecho retirado do projeto]
No cenário global turbulento da segunda década do
terceiro milênio, a população mundial assiste atônita aos desafios políticos e
econômicos desprendidos pelos países desenvolvidos para superar suas dívidas
astronômicas.
Paradigmas
econômicos até pouco tempo considerados inabaláveis entraram na pauta das
instituições de crédito, como o Fundo Monetário Internacional e o Banco
Mundial. A situação aprofunda a falta de confiança dos investidores nos países
desenvolvidos e deposita as esperanças nos “países emergentes”, entre eles o
Brasil. [...]
O Estado do Acre é um pedaço
desconhecido do país para a maioria dos brasileiros, principalmente para
aqueles que vivem nas regiões sul e sudeste, as mais ricas e influentes. Sua
história foi constantemente influenciada por interesses econômicos nacionais e
internacionais, antigamente os conhecidos “ciclos da borracha” e atualmente a
abertura de um canal rodoviário para o Oceano Pacífico. Ocupações desordenadas,
intercaladas por momentos de ostracismo, deixaram profundas cicatrizes em sua
população, especialmente na sua figura mais conhecida, o seringueiro.
O
seringueiro é o ícone do Acre e sua figura representa uma parte importante da
dinâmica do Estado. Sem dúvida, o seringueiro mais famoso foi Chico Mendes,
cujos ideais de luta contra a exploração predatória e desigualdade social
continuam atuais, quase vinte e cinco anos após a sua morte. O discurso
político e ambiental relacionado ao modo de vida do seringueiro deu
visibilidade mundial para uma região que o próprio país insiste em não
enxergar. Os “povos da floresta”, aqueles que dependem da preservação da
floresta amazônica para extrair o seu sustento, foram transformados em um mito
cuja apropriação política serviu para atender aos mais diversos interesses,
muitas vezes afastados daqueles originalmente levantados.
A
tarefa de esmiuçar o mito dos “povos da floresta” e relacionar os interesses
políticos e econômicos vigentes no Acre e na Amazônia a partir de uma visão
globalizada nunca foi mais atual. A história de luta de sua população
tradicional, os atuais projetos do Estado e de suas pequenas experiências
cotidianas são alicerces que servem de ponto de partida para uma profunda
análise filosófica, política e econômica, que deve enriquecer a pauta mais
importante e atual da sociedade pós-moderna: Em que mundo nós queremos
viver?
Comentário: Muitos projetos não possuem esse formato de
introdução. Esse tópico não faz parte de muitas metodologias de pesquisa, sendo
substituído pela definição do tema,
do problema e da hipótese. Em um livro-reportagem, porém,
esse espaço torna-se mais aceitável. É como um capítulo de apresentação do
livro, uma oportunidade em que o(s) autor(es) apresentam o porquê da escolha do
tema. Explicitam o interesse e a importância desta escolha na área de
conhecimento em que se insere. Pode ser comparado com a justificativa, na metodologia de pesquisa, mas é ainda mais
informal.
Objetivos [trecho do projeto]
Específicos: Analisar
metodologicamente o mito criado sobre “povos da floresta” Amazônica,
especificamente do Estado do Acre. A apropriação política, econômica e social
desse mito, partindo de histórias individuais de personagens da região e
contextualizando-as em relação aos públicos de influência nacionais e
internacionais.
Gerais:
Evidenciar os desafios e conquistas da população amazônica e fomentar um debate
qualificado sobre os resultados e projetos da região norte, despertando a
responsabilidade da população brasileira no tratamento de suas riquezas.
Comentário: Aqui está a indicação do que se pretende (finalidade)
como resultado do trabalho. Deve ser expresso de maneira clara, sucinta e
direta. Alguns verbos recomendados para a formulação de objetivos costumam ser:
medir, descrever, comparar, examinar,
analisar, descobrir (para características, efeitos e processos), construir, obter e identificar (para
critérios, padrões e causas). Os objetivos também sofreram modificações após a
apresentação do projeto e ficaram um pouco mais delimitados.
Evidentemente coloquei apenas alguns tópicos do nosso
projeto de pesquisa. A intenção é dar uma idéia de como o texto é estruturado e
evidenciar as dificuldades que encontramos para delimitar o assunto e os
objetivos. Para quem está fazendo um trabalho jornalístico, as regras
metodológicas de pesquisa acabam sendo muito rígidas.
Definir os objetivos do trabalho
antes de iniciar a apuração pode parecer estranho inicialmente. Aprendemos
durante a faculdade a não realizar uma reportagem com a visão pré-concebida dos
fatos, porém o projeto não deve ser visto dessa forma. Ele é um exercício
importante para o autor começar a se aprofundar no tema de interesse e realizar
as primeiras reflexões.
Nosso projeto evidencia a amplitude
do tema e dos objetivos. Sem colocar essas informações no papel a análise
crítica não seria possível. O importante é que isso não deve ser motivo de
desespero - “Oh! O meu projeto está todo
errado, meu trabalho vai ser um lixo!”. Reaja e trabalhe em cima dele.
Contratempos sempre acontecem. Ao invés de evitá-los, fique sempre preparado
para aceitar e se adaptar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário